11
Nov 08

Muitos críticos são ridículos e mais ridículos são aqueles que pensam que sabem escrever. Há um preconceito muito grande em relação aos jovens autores, muitos deles num patamar muito superior aos mais velhos que editam regularmente. Vejam este exemplo do Pedro Mexia sobre Vasco Gato: muito diferente é Vasco Gato, tributário de um entendimento "fulgurante" da poesia. Gato, que se estreou com o adolescente Um Mover de Mão (2000) e com o pouco melhor Imo (2003), surpreende pela positiva com A Prisão e Paixão de Egon Schiele. Enfim, valoriza um livro, desvaloriza os outros dois anteriores. Um deles eu conheço: Um mover de mão, livro que considero dos melhores e mais sinceros livros de poesia alguma vez escritos em Portugal. Se o Pedro Mexia o lesse a sério talvez um dia  (e estou a ser muito optimista) se tornasse um bom autor de poesia e um crítico competente.

 

 

postado pelo Casa dos Poetas às 13:17
Canção:: goldfrapp - clowns
Poesia e Alguns dos Poetas da Casa:

17
Out 08

Janeiro

 

É esta a completude dos dias

Quando se reúnem sobre a cidade

Os sossegos da nossa idade já meiga.

São estas as palavras que ficam

Desde o interior do nosso mais antigo nome.

 

É o inverno aberto de janeiro

Com as árvores despidas e o frio azul,

É o ano que começa no tempo que é nada,

Os bolsos que se enchem de mãos,

As casas que parecem mais juntas.

 

Por esta altura estarão a nascer

As horas mais felizes das nossas vidas

- bebemos chá escutando o lume

E amanhã será um dia a menos,

Um outro som acrescentando à voz,

Um abraço fechando-se até ao amor.

 

 

 

Um dizer ainda puro

 

imagino que sobre nós virá um céu

de espuma e que, de sol em sol,

uma nova língua nos fará dizer

o que a poeira da nossa boca adiada

soterrou já para lá da mão possível

onde cinzentos abandonamos a flor.

 

dizes: põe nos meus os teus dedos

e passemos os séculos sem rosto,

apaguemos de nossas casas o barulho

do tempo que ardeu sem luz.

sim, cria comigo esse silêncio

que nos faz nus e em nós acende

o lume das árvores de fruto.

 

diz-me que há ainda versos por escrever,

que sobra no mundo um dizer ainda puro.

 

 

 

Traço comum

 

descalço-me de sombras para chegar a ti

as linhas do meu rosto são claríssimas

nelas não vês o velho, a criança, o adulto

vês apenas o traço comum

que é onde eu procuro a tua mão

na transparência da minha palavra inteira

 

 

 

Muito pouca

 

a morte é uma coisa muito pouca

em nada se compara ao crescimento das constelações

a morte não respira nem se expande desde o centro

como fazem as estações desde o coração da terra

 

e assim eu sei que um sorriso é precioso

porque respira e alarga-se dentro dos olhos

e quando chega ao lugar em que a mão se abre

é já uma forma de sossego uma lua coberta de luar

um modo certo de trocar nomes em dias de excepção

 

 

 Vasco Gato

in  Um Mover de Mão, Assírio e Alvim, 2000.

 

 

 

postado pelo Casa dos Poetas às 20:22
Canção:: Jay Jay Johanson - She doesn't live here anymore
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