Na Casa dos Poetas somos grandes fãs de Paul Auster. Desconhecido para o grande público como poeta, sendo muito reconhecido como contista e romancista devido a best-sellers como trilogia de nova iorque, mr. vertigo, timbuktu, o livro das emoções e a noite do oráculo, aqui tentamos mostrar o talento de Auster para a poesia, género em que deu os primeiros passos no mundo da literatura. Os poemas que se seguem, à semelhança de outro poema que aqui já colocámos, integram a antologia poemas escolhidos, lançada pelas edições quasi em 2002 e tem tradução de Rui Lage.
Fragmento de frio
Porque cegamos
No dia que sai connosco,
E porque vimos o nosso hálito
Embaciar
O espelho do ar,
A nada se abrirá
O olho do ar
Senão à palavra
Que renunciamos: o inverno
Terá sido um espaço
De maturidade.
Nós que nos tornamos nos mortos
De outra vida que não a nossa.
Irlanda
Gasta de turfa, ó tu em abandono posta de charnecas,
Tu, a mais nua, banhada na escuridão
Da profunda e verdejante
Ravina, da cama cinzenta
Que o meu fantasma
Furtou à boca
Das pedras – investe-me de silêncio
Com que ampare as asas das gralhas, concede-me
Que de novo passe por aqui
E respire o ar acerbo e maltratado
Que ainda trafica a tua vergonha,
Dá-me o direito de te destruir
Na língua que empala
A nossa colheita, as cruéis
Searas do frio.