17
Out 08

Janeiro

 

É esta a completude dos dias

Quando se reúnem sobre a cidade

Os sossegos da nossa idade já meiga.

São estas as palavras que ficam

Desde o interior do nosso mais antigo nome.

 

É o inverno aberto de janeiro

Com as árvores despidas e o frio azul,

É o ano que começa no tempo que é nada,

Os bolsos que se enchem de mãos,

As casas que parecem mais juntas.

 

Por esta altura estarão a nascer

As horas mais felizes das nossas vidas

- bebemos chá escutando o lume

E amanhã será um dia a menos,

Um outro som acrescentando à voz,

Um abraço fechando-se até ao amor.

 

 

 

Um dizer ainda puro

 

imagino que sobre nós virá um céu

de espuma e que, de sol em sol,

uma nova língua nos fará dizer

o que a poeira da nossa boca adiada

soterrou já para lá da mão possível

onde cinzentos abandonamos a flor.

 

dizes: põe nos meus os teus dedos

e passemos os séculos sem rosto,

apaguemos de nossas casas o barulho

do tempo que ardeu sem luz.

sim, cria comigo esse silêncio

que nos faz nus e em nós acende

o lume das árvores de fruto.

 

diz-me que há ainda versos por escrever,

que sobra no mundo um dizer ainda puro.

 

 

 

Traço comum

 

descalço-me de sombras para chegar a ti

as linhas do meu rosto são claríssimas

nelas não vês o velho, a criança, o adulto

vês apenas o traço comum

que é onde eu procuro a tua mão

na transparência da minha palavra inteira

 

 

 

Muito pouca

 

a morte é uma coisa muito pouca

em nada se compara ao crescimento das constelações

a morte não respira nem se expande desde o centro

como fazem as estações desde o coração da terra

 

e assim eu sei que um sorriso é precioso

porque respira e alarga-se dentro dos olhos

e quando chega ao lugar em que a mão se abre

é já uma forma de sossego uma lua coberta de luar

um modo certo de trocar nomes em dias de excepção

 

 

 Vasco Gato

in  Um Mover de Mão, Assírio e Alvim, 2000.

 

 

 

postado pelo Casa dos Poetas às 20:22
Canção:: Jay Jay Johanson - She doesn't live here anymore
Poesia e Alguns dos Poetas da Casa: , ,

E que bela esta casa.

Que se mantenha assim por muitos anos.

Voltarei muitas vezes.

http://desabafos-solitarios.blogspot.com/
BSH a 18 de Outubro de 2008 às 14:13

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